Era uma vez uma fada chamada Oriana, que vivia numa grande floresta. Nessa floresta viviam um Moleiro, sua mulher e seus onze filhos, um Lenhador, sua mulher e o filho deles, uma Velhinha e um Poeta, mais os animais e as plantas.
Um dia, enquanto Oriana brincava, apareceu a Rainha das Fadas Boas para lhe dizer que ia ser a fada daquela floresta e, por isso, Oriana tinha de lhe prometer que ia tomar conta da floresta e de todos os homens e animais que lá viviam. Oriana ficou toda contente e prometeu à Rainha das Fadas Boas que iria tomar conta da floresta para sempre e jamais a abandonaria.
Oriana, como fada que era, tinha umas asas, para voar muito depressa, e uma varinha de condão, para transformar as coisas, para fazer magia. E a partir do dia da sua promessa, Oriana passou a ter uma rotina diária, que começava logo de manhã bem cedo: primeiro ia a casa do Moleiro preparar o pequeno-almoço para todos e arrumar a casa, depois ia casa do Lenhador, que era muito pobre, e levava consigo três pedrinhas brancas, que transformava, com a sua varinha de condão, em coisas que eram necessárias à família. Ajudava a Velhinha a chegar à cidade, porque ela via muito mal e podia cair num buraco que havia na estrada. Esse buraco chamava-se abismo. Ajudava os animais e as plantas sempre que precisavam dela. E à noite ia fazer companhia ao seu amigo Poeta. E todos os dias repetia as mesmas tarefas ajudando e protegendo todos aqueles que precisavam.
Um dia quando passeava junto a um pequenino rio que havia na floresta, ouviu alguém chamar por ela. Era um peixinho que estava deitado na areia, quase a morrer por falta de água, e lhe pediu para o colocar novamente na água do rio. Ao colocá-lo, Oriana viu o seu reflexo na água e ficou muito contente, porque viu que era muito bonita. E perguntou ao peixe se ele a achava também muito bonita. O peixinho respondeu-lhe que era a pessoa mais bonita que algum dia tinha visto. Ficou tão contente ao ouvir isso que Oriana acabou por passar todo o dia junto ao rio a ver o seu reflexo na água.
Ao anoitecer Oriana foi visitar o seu amigo Poeta, que morava numa torre. Todos os dias ao anoitecer Oriana visitava-o. E ficavam juntos a conversar até ouvirem as doze badaladas do sino de uma igreja, que ficava ali perto.
Dia após dia a Fada Oriana cumpria a sua rotina, mas desde que viu a sua imagem no rio passou a ir mais vezes para junto dele ver o seu reflexo na água e conversar com o peixinho, para o ouvir dizer que ela era muito bonita.
Num certo dia o peixe disse-lhe que ela podia ficar ainda mais bonita, se ela se enfeitasse com coroas de flores e colares de pérolas. E Oriana começou a passar ainda mais tempo junto do rio e menos tempo a fazer as suas tarefas. Como no rio não havia pérolas para ela fazer colares, o peixe do rio disse-lhe para ir ao mar pedir a um peixe que lhe arranjasse as pérolas. E assim fez. Oriana foi até ao mar e pediu ao peixe Salomão que lhe trouxesse muitas pérolas. Mas as pérolas estavam muito longe e peixe Salomão disse-lhe para esperar sentada numa rocha junto ao mar. Ali passou sete dias e sete noites, sem ir à floresta e sem cumprir a sua promessa, de tomar conta todos os dias dos homens, animais e plantas que viviam na floresta.
Quando o peixe Salomão chegou com as pérolas, Oriana foi muito depressa para a floresta, mas quando chegou já lá não morava ninguém. Os homens foram para a cidade e os animais para o monte.
De repente apareceu a Rainha das Fadas Boas, que estava muito chateada porque ela não cumpriu a sua promessa. E para castigá-la a Rainha das Fadas Boas retirou as asas e a varinha de condão a Oriana. Agora Oriana já não era uma fada, porque tinha abandonado os homens e os animais que viviam na floresta e estes fugiram. Oriana ficou muito triste por ter acreditado no peixe do rio e por ter abandonado a floresta.
Agora, para voltar a ser uma fada, Oriana tinha de fazer voltar para a floresta todos os homens e animais que lá moravam. Sem esperar mais tempo, partiu para a cidade, que era muito, muito grande, à procura do Moleiro, do Lenhador e do Poeta. Perguntou a toda a gente que encontrava se sabiam onde eles moravam. Mas ninguém sabia. Até que um gato, que a ouviu perguntar, disse-lhe que sabia onde moravam as pessoas que ela procurava. Oriana foi com o gato, pelas ruas da cidade, até às casas dessas pessoas, mas as pessoas não acreditaram nela, porque ela já não era uma fada, não tinha asas, nem varinha de condão. O Moleiro disse-lhe que só ia outra vez para a floresta se ela encontrasse o seu filho que perdera. A mulher do Lenhador disse que só voltavam para a floresta se ela tirasse o marido da prisão, que estava preso por ter roubado dois cobertores para aquecer o filho, que morria de frio e eles não tinham dinheiro. E o Poeta só voltava para a floresta se Oriana voltasse a encantar a noite como fazia antigamente.
Muito triste, Oriana saiu da cidade e foi para o monte à procura dos animais. Quando encontrou os animais, reparou que com eles estava o filho do Moleiro que se tinha perdido e Oriana pediu-lhes que lhe entregassem o rapaz para ela entregar aos seus pais. Mas os animais não acreditavam nela, porque ela já não era uma fada, nem se quer tinha asas, nem varinha de condão. E não lhe deram o rapaz. Muito desanimada e triste por não conseguir levar o filho do Moleiro aos seus pais, Oriana resolve, então, voltar para a floresta.
A caminho da floresta surge repentinamente, mesmo à sua frente, uma fada muito bela, que lhe promete dar novas asas e nova varinha de condão, mas para isso tinha de lhe prometer uma coisa. Oriana fica cheia de felicidade por poder voltar a ser uma fada e pergunta-lhe o que é que tinha de fazer. Então a outra fada, que era muito bela, disse-lhe as coisas que ela tinha de fazer e eram tudo coisas muito más, porque essa fada que apareceu a Oriana era a Rainha das Fadas Más. Oriana, cheia de raiva, virou-se para ela e, de imediato, respondeu-lhe que não fazia o que ela lhe pedira e que preferia nunca mais ser uma fada, do que ter que fazer coisas más. E sem hesitar foi-se embora.
Oriana decidiu então ir também viver para a cidade, porque era lá que estavam as pessoas e era lá que as podia ajudar. Quando ia para a cidade viu ao longe a Velhinha, que quase já não via e caminhava toda curvada, amarrada a um pau. E a Velhinha estava muito perto do buraco que havia no caminho e que se chamava abismo. E Oriana estava ainda muito longe dela. Oriana correu, correu muito depressa para guiar a Velhinha. Mas ao chegar perto dela, a Velhinha deu mais um passo e caiu no buraco, que era muito fundo e muito escuro. Oriana nem pensou, nem se lembrou que já não tinha asas e saltou para o buraco para salvar a Velhinha. E as duas agarradas uma à outra caíam, caíam nesse buraco que se chama abismo e era muito fundo. Mas de repente, no escuro do abismo surge uma luz muito brilhante. Era a Rainha das Fadas Boas! E com a sua varinha de condão toca nos ombros de Oriana e dá-lhe novamente as suas asas de fada e a sua varinha de condão. E assim Oriana conseguiu salvar a Velhinha.
Muito contente por ter voltado a ser a Fada Oriana, voou rapidamente para o monte a fim de encontrar os animais e o filho do Moleiro. Pegou no rapaz e voou ainda mais rapidamente para a cidade para o entregar a seus pais, que ficaram muito contentes e decidiram logo voltar para a floresta. De imediato foi até à prisão e com a sua varinha de condão soltou o Lenhador, que logo decidiu voltar novamente para a floresta. Já estava a ficar noite quando Oriana encontrou o Poeta num café da cidade e o levou novamente para a sua torre que ficava na floresta. Os animais também voltaram todos para a floresta. E Oriana prometeu novamente que de agora em diante jamais os abandonaria. E o Poeta pediu à Fada Oriana, como costumava pedir antigamente: - Encanta a noite, Oriana!
E a Fada Oriana com a sua varinha de condão encantou a noite como dantes.
(Versão da Fada Oriana de Sophia de Mello Breyner Andresen – David Carpinteiro)
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